sexta-feira, 27 de agosto de 2010

UM CONVITE À INTERDISCIPLINARIDADE PARA A FORMAÇÃO DE PSICÓLOGOS

*Eliane de Jesus

O cenário mundial redesenhou-se em razão da abertura de fronteiras de naturezas diversas pelo império de tecnologias da informação cada vez mais novas, como instrumento planetário de comunicação, gerando e ampliando laços de interdependência múltipla entre povos e nações pelos cantos do mundo, em toda a sua diversidade.

O fenômeno da “Mundialização” ou Globalização, na linguagem mais corrente, se reveste e se propaga de maneiras diversificadas no mundo contemporâneo, onde a tecnologia encurta o tempo e o espaço e expandidos são a humanidade e seus problemas.

O Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, conhecido como “o Relatório Jacques Delors”, em sua edição brasileira (2004), publicado sob o título Educação – um tesouro a descobrir considera o mundo contemporâneo paciente de uma interdependência conjuntural que lhe configura como uma caixa, onde a “música” que toca é a ressonância das crises, de todos os povos e nações, uns sobre os outros.

A globalização não só atingiu a economia, as atividades, a geografia do mundo, mas também a comunicação dos povos, permitindo pensar-se em uma comunicação universal, onde se impõe a interatividade.

Mais do que transmitir informações sem limites de distância ou de tempo, as necessidades planetárias exigem o diálogo, a discussão, a reflexão crítica sobre essas informações, sobre essa livre circulação de imagens, palavras e idéias, de tal modo que novas interpretações possam orientar uma nova hierarquização fundada num repensar e num resgate de valores, que possibilitem a construção de novos conhecimentos e o despertar de novas consciências.

A educação é o caminho. Os educadores são os agentes de transformação, formadores não só do caráter e do espírito das novas gerações, mas das novas gerações de profissionais compromissados com o desenvolvimento desta “aldeia global”.

As políticas educativas foram consideradas pela Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI (apud DELORS, 2004) como

Um processo permanente de enriquecimento dos conhecimentos, do saber-fazer, mas também e talvez em primeiro lugar, como uma via privilegiada de construção da própria pessoa, das relações entre indivíduos, grupos e nações.

As Instituições de Ensino Superior devem reorientar suas ações educativas pelo espírito de universalidade, constituir-se como local de ciência (fonte de produção de conhecimento), e como meio de qualificação profissional (conciliadora do saber com o saber-fazer dos novos e futuros profissionais), como recinto privilegiado de uma educação para toda a vida e como parceiro privilegiado de uma cooperação internacional, resgatando assim o sentido de sua missão intelectual e social.

A multiplicidade de expressão da diversidade humana, confrontada com esses ideais, coloca em destaque uma das tarefas essenciais da educação - transformar a interdependência real em solidariedade no empreendimento de compreender o mundo, e esta desperta e acentua o desafio de compreender o outro, de compreender as relações que se estabelecem entre o homem e seu ambiente, o que, em última instância, evoca o compromisso de conhecer e compreender a si mesmo.

Os pensadores de uma educação para o novo milênio, aqui assim chamados os integrantes da Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI, chamam a atenção para a tendência do homem contemporâneo de fechar-se sobre si mesmo, e para a necessidade de ultrapassar essa tendência, abrindo-se à compreensão dos outros, uma atitude eticamente orientada pelo respeito à diversidade.

Por que não ousar situar nesse pensamento o comportamento das ciências no novo milênio?

Por que não falar da Universidade como sede de convergência dos diversos saberes, interligados por uma solidariedade fundada no compromisso e interesse comum de conhecer mais e melhor o mundo, de forma mais integral, e assim sejam orientados, esses saberes, para superar a fragmentação e buscar a integração para a promoção do saber-fazer de novos profissionais ?

Solidariedade científica - Educação ou utopia?

Os pensadores de uma educação para o novo milênio conferem à educação essa especial responsabilidade – edificar um mundo mais solidário – e esta deve traduzir-se nas políticas e nas ações educativas das instituições de ensino: gestar um novo humanismo, eticamente fundado na cooperação interpessoal, internacional, interdisciplinar, interplanetária.

O que é Interdisciplinaridade?

Refletindo sobre a etimologia do termo, Interdisciplinaridade é uma palavra de origem latina e de composição tríplice: inter, que significa posição ou ação intermediária, interação; dade, sufixo que se empresta a substantivar alguns adjetivos, atribuindo-lhes o sentido de ação ou resultado de ação, modo de ser; e disciplina, que significa 1. conjunto de regras que regem uma organização, uma atividade; 2.ensino, instrução; 3.matéria de ensino.

A palavra interdisciplinaridade ainda tem encontrado interpretações que a tomam como um encontro que pode ocorrer entre seres – inter – num certo fazer, a partir da direcionalidade da consciência, com a finalidade de conhecer o objeto e com ele relacionar-se e comunicar-se.

Fazendo remissão à etimologia do termo, novamente, é, portanto, uma palavra que remete a considerações a cerca de uma ação, de um modo de ser que se rege pela interação, pelo colocar-se como mediador de uma ação, de uma atividade, no caso, de ensino.

Parece ainda possível agora ousar outra interpretação, especificamente voltada para o objeto que aqui se justifica, a qual a priori assim se organiza:

Interdisciplinaridade, no ensino superior, é a ação educativa cujos modos de ser e de fazer se regem por um espírito de interação entre os diversos componentes da matriz curricular e as experiências educativas extracurriculares significativas à formação profissional em andamento, e se orientam por regras que os situam como agentes mediadores do projeto de ensino e intermediadores do processo de construção do conhecimento do educando almejado com o ensino.

A interdisciplinaridade pressupõe além da ação intermediadora, o espírito de solidariedade, de integração, de superação da ação especialista; uma visão de mundo mais integral, orientada pelo desejo de reunificar o pensar e o fazer do homem no mundo e é esse o espírito que deve fundamentar e orientar a educação comprometida com um novo humanismo.

Formar pensadores e profissionais de visão ampla e olho crítico voltados para o novo desenho do mundo impõe uma comunhão de desejos e esforços que só parece possível (se pretensora de sucesso!) no discurso interdisciplinar.

O compromisso com a educação e com a formação de profissionais psicólogos competentes para participar desse projeto global do novo milênio fomenta a ação interdisciplinar daqueles que se solidarizam neste empreendimento.

Os Cursos de Graduação em Psicologia, pela ação intermediadora e integrada dos componentes curriculares de sua matriz precisam oportunizar aos psicólogos em formação profissional a construção de conhecimentos que possibilitem:

 seu desenvolvimento como ser humano;

 seu crescimento acadêmico;

 uma formação profissional de excelência, através do incentivo e desenvolvimento da pesquisa científica;

 o desenvolvimento de uma linguagem própria, autônoma e independente e seu uso como agente participativo no cenário da comunicação universal onde possa este profissional colocar-se como produtor de novos textos;

 capacitação para ler crítica e reflexivamente o cenário sócio-político-cultural contemporâneo do mundo e da própria profissão;

 desenvolvimento de aptidões, habilidades, talentos, criatividade, sociabilidade e humanidade

 consciência de sua responsabilidade pessoal, social, profissional e moral para com a vida e com o ser humano;

 desenvolvimento de uma nova consciência a cerca de sua identidade profissional e de seu papel como agente de transformação social e promoção do desenvolvimento humano.

A educação, empreendedora de um mundo e de uma vida melhores pressupõe o resgate de valores que os pensadores de uma educação para o novo milênio denominaram de Os Quatro Pilares da Educação, a saber:

• Aprender a conhecer;

• Aprender a fazer;

• Aprender a viver juntos, aprender a viver com os outros;

• Aprender a ser.

Mais ainda:

considerando o panorama atual da existência humana, a própria Comissão Internacional sobre Educação, ao priorizar o Aprender a viver juntos como caminho de transformação, aponta para a necessidade de se aprender a conhecer, aprender a fazer e aprender a ser, JUNTOS!.

Oxalá esse convite seja aceito!